domingo, 1 de março de 2015

Cinquenta Tons de Álcool



A fila no Posto de Combustível já dobrava a esquina quando Valdir estacionou seu Monza 86 financiado, com os pneus carecas, estofamento em petição de miséria e a lataria carcomida que um dia foi branca, no momento está prata e até o fim do ano vai estar só o Pó.  
                                       
Alguém lá da frente gritou: “-Pessoal? A gasolina acabou! Agora só temos Álcool!” O que já eliminou metade dos mais de cento e cinquenta carros que em menos de quinze minutos se aglomeraram por ali. 
                                                                                  
O sol a pino, mais o sono do pós-almoço junto com a preguiça de ter que encarar o resto da tarde na obra fez com que o Pedreiro não desce ouvidos aos reclames cheios de discursos inflamados contra o governo vindo  dos companheiros de fila.  
                       
Apesar da lentidão, a fila andava, e ao se aproximar das bombas, Valdir, aos poucos, foi se sentindo frustrado, diminuído, acuado. Afinal, era um tal de “completa o tanque” daqui. Um “coloca cem reais” dali. Que o Pedreiro estava se sentindo deslocado na companhia daquela ostentação toda a base de cartões de crédito. Por muito pouco não desistiu da empreitada. Mas, resolveu seguir o conselho que o pai havia lhe ensinado, ainda em seu leito de morte: “-Começou vá até o fim!” 
                         
Uma hora e cinco minutos depois, finalmente Valdir chegou à bomba de combustível, feito esse que por si só já era motivo de orgulho, afinal, havia vencido uma batalha árdua em dias de greve de caminhoneiros. 
                                                            
-Quanto vai patrão?!   
                                                                                                        
-Cinquenta centavos de álcool, por favor! 
                                                                               
O frentista, num misto de espanto e sarcasmo, perguntou novamente.  
                      
-Desculpe querido, não entendi direito. Quanto vai? 
                                                        
Valdir, novamente, no mesmo tom de voz, repetiu.
                                                
-Cinquenta centavos de álcool! – E entregou um copo de plástico para o frentista que, ressabiado abasteceu-o, nem chegando a enchê-lo. Com cara de poucos amigos o frentista entregou o copo para Valdir que, para espanto geral da nação ali presente, numa golada só virou o copo de álcool na boca. Segundos depois, com os olhos em chamas e o rosto rubro Valdir saracoteou a cabeça e ao entregar a moeda perguntou ao frentista.                                            
-Não tem um chorinho, amigo?

Nenhum comentário:

Postar um comentário